A imprensa tem veiculado recentemente reportagens em que esportistas atribuem a farmácias de manipulação a responsabilidade pela contaminação de outros produtos que utilizam por diuréticos.

O consumo de diuréticos por atletas que participam de competições é vetado pela Agência Mundial Antidopagem (Wada), porém, essas substâncias proibidas no esporte, pelo fato de poderem mascarar o uso de alguns produtos, como anabolizantes e estimulantes, são detectadas com frequência nos testes realizados.

Os casos no Brasil cresceram exponencialmente após a Wada, em 2015, colocar a “contaminação cruzada” como atenuante dos casos de doping. A partir disso, acusação de “contaminação cruzada” em farmácias de manipulação se transformou numa clara estratégia de defesa utilizada pelos advogados dos atletas flagrados utilizando substância ilegais.

O CRF-SP, que possui a atribuição de fiscalizar o exercício da profissão no Estado de São Paulo, se posiciona contra esse tipo de alegação utilizada pelos esportistas e seus advogados, sem que haja fundamentação e comprovação prévia dos fatos.

No Brasil, a atividade de manipulação de medicamentos é rigorosamente regulamentada por normas que asseguram a qualidade, segurança e rastreabilidade dos produtos disponibilizados aos pacientes. Sendo possível, inclusive, averiguar se no dia em que ocorreu a manipulação de um produto utilizado pelo atleta, houve a manipulação de diuréticos.

As farmácias somente podem funcionar com a presença de um farmacêutico, que é responsável por todo o processo desde a qualidade da matéria-prima, até o medicamento que é dispensado. Esses estabelecimentos são fiscalizados pelos conselhos regionais e pelas vigilâncias sanitárias, que possuem a competência para interditar os locais que não têm boas práticas de manipulação.

Para o presidente do CRF-SP, Dr. Marcos Machado, tal atitude por parte dos atletas é inaceitável e deve ser combatida, já que esse tipo de acusação vem ocorrendo com certa frequência nos últimos anos. “Várias foram as vezes em que atletas flagrados no exame antidoping acusaram farmácias e colocaram os farmacêuticos em situação de dúvida profissional. Não aceitamos mais isso. O CRF-SP oferecerá apoio jurídico aos profissionais que necessitarem”.

Vice-presidente do CRF-SP e farmacêutico atuante na área magistral, Dr. Antonio Geraldo dos Santos ressalta a importância de se investigar todos os casos de atletas que alegam terem sido vítimas de contaminação cruzada em farmácias de manipulação, um setor produtivo que emprega uma quantidade significativa de pessoas, principalmente farmacêuticos.

“Na maior parte dos casos até hoje atribuídos à contaminação cruzada em farmácias de manipulação, os estabelecimentos foram isentos de qualquer responsabilidade. Então, essa situação me leva a acreditar que, após a atenuante instituída pela Wada em 2015, muitos advogados se utilizam desses subterfúgios da lei para isentar seus clientes, o que gera uma insegurança jurídica”.

Dados das farmácias de manipulação são publicados pela Anfarmag

A Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais (Anfarmag) publicou um comunicado em que cita estudo realizado pela entidade a partir de 2010 com cerca de 27 mil fichas que registram os medicamentos entregues pelas farmácias a cada paciente, o qual mostrou que menos de 2% das receitas médicas aviadas traziam prescrição de diuréticos e que não havia receita com prescrição de diurético isolado, o que demonstra a baixa frequência com que o setor de farmácias de manipulação trabalha com diuréticos. Demonstra também que, sempre que um diurético é prescrito, o médico opta por prescrevê-lo associado a outros fármacos, como parte de uma formulação maior.

Para Ademir Valério, presidente do Conselho de Administração da Anfarmag, esses dados são extremamente relevantes: “O processo de manipulação é seguro e não permite a contaminação. Porém, vamos extrapolar: admitindo que houvesse eventual equívoco no processo que levasse à contaminação acidental com um diurético, necessariamente haveria também a presença de outros fármacos combinados com essas substâncias, uma vez que elas estão sempre em associação nos medicamentos manipulados”, argumenta. “Além disso, a distribuição desse diurético não seria uniforme entre supostas cápsulas contaminadas. Isso pode ser rastreado e precisa ser levado em conta”.